segunda-feira, 14 de junho de 2010

ESCUTATÓRIA!

ESCUTATÓRIA
Rubem Alves
Texto proferido na Sessão Mediúnica de 21 de maio de 2010.

Sempre vejo anunciados cursos de oratória. Nunca vi anunciado curso de escutatória. Todo mundo quer aprender a falar... Ninguém quer aprender a ouvir. Pensei em oferecer um curso de escutatória, mas acho que ninguém vai se matricular. Escutar é complicado e sutil.
Diz Alberto Caeiro que... Não é bastante não ser cego para ver as árvores e as flores. É preciso também não ter filosofia nenhuma. Filosofia é um monte de idéias, dentro da cabeça, sobre como são as coisas. Para se ver, é preciso que a cabeça esteja vazia. Parafraseio o Alberto Caeiro: Não é bastante ter ouvidos para ouvir o que é dito. É preciso também que haja silêncio dentro da alma. Daí a dificuldade...
A gente não agüenta ouvir o que o outro diz sem logo dar um palpite melhor... Sem misturar o que ele diz com aquilo que a gente tem a dizer. Como se aquilo que ele diz não fosse digno de descansada consideração... e precisasse ser complementado por aquilo que a gente tem a dizer, que é muito melhor...
Nossa incapacidade de ouvir é a manifestação mais constante e sutil de nossa arrogância e vaidade. No fundo, pensamos ser os mais bonitos, os mais inteligentes...
Tenho um velho amigo, que se mudou para os Estados Unidos estimulado pela revolução de 64. Contou-me de sua experiência que teve com os índios: Reunidos os participantes da tribo, ninguém fala. Há um longo, longo silêncio para depois um dar o sinal e falar e todos escutam, mesmo que não concorde com o que está sendo dito. Todos os que quiserem falar podem, porém, um de cada vez...sendo ouvido pelos demais. Isso se assemelha aos pianistas, por exemplo, que antes de iniciar o concerto, diante do piano, ficam assentados em silêncio... Abrindo vazios de silêncio... Expulsando todas as idéias estranhas. O silêncio do grupo indígena reunido fica assim a espera do pensamento essencial. Aí, de repente, alguém fala. Curto. Todos ouvem. Terminada a fala, novo silêncio. Falar logo em seguida seria um grande desrespeito, pois o outro falou os seus pensamentos... Pensamentos que ele julgava essenciais. São-me estranhos. É preciso tempo para entender o que o outro falou.
O longo silêncio quer dizer: Estou ponderando cuidadosamente tudo àquilo que você falou. E, assim vai à reunião. Não basta o silêncio de fora. É preciso silêncio dentro. Ausência de pensamentos. E aí, quando se faz o silêncio dentro, a gente começa a ouvir coisas que não ouvia.
Se eu falar logo a seguir... São duas as possibilidades. Primeira: Fiquei em silêncio só por delicadeza. Na verdade, não ouvi o que você falou. Enquanto você falava, eu pensava nas coisas que iria falar quando você terminasse sua (tola) fala. Falo como se você não tivesse falado. Segunda: Ouvi o que você falou. Mas, isso que você falou como novidade eu já pensei há muito tempo. É coisa velha para mim. Tanto que nem preciso pensar sobre o que você falou. Em ambos os casos, estou chamando o outro de tolo. E isso mostra a vaidade, arrogância e falta de humildade, porque, o que ele for falar também outros certamente já pensaram ou já ouviram falar. Não devemos nos “achar” o inédito no que pensarmos ou falarmos. Sempre haverá quem nos antecedeu naquilo que estamos falando.
Por fim posso afirmar que ouvir mais do que falar é um bom método de aprendizado.

Sérgio Pereira/Kajaide
Orientador Espiritual
Ano de Yemanjá/Vênus
“Eu Posso! Eu Posso!”

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