OS ANIMAIS E O HOMEM.
AQUI UMA VISÃO DA ORIENTAÇÃO DOS
ESPÍRITOS SOBRE O QUE A ESPIRITUALIDADE FALA DO RELACIONAMENTO DOS
HOMENS COM OS ANIMAIS DE ESTIMAÇÃO.
O Livro dos Espíritos
por ALLAN KARDEC – tradução de José Herculano Pires
II – Os Animais e o Homem
592. Se comparamos o homem e os animais em relação à inteligência,
parece difícil estabelecer a linha de demarcação, porque certos animais
têm, nesse terreno, notória superioridade sobre certos homens. Essa
linha de demarcação pode ser estabelecida de maneira precisa?
—
Sobre esses assuntos os vossos filósofos não estão muito de acordo. Uns
querem que o homem seja um animal, e outros que o animal seja um homem.
Estão todos errados. O homem é um ser à parte, que desce, às vezes,
muito baixo ou que pode elevar-se muito alto. No físico, o homem é como
os animais e menos bem provido que muitos dentre eles; a Natureza lhes
deu tudo aquilo que o homem é obrigado a inventar com a sua inteligência
para prover às suas necessidades e à sua conservação. Seu corpo se
destrói como o dos animais, isto é certo, mas o seu Espírito tem um
destino que só ele pode compreender, porque só ele é completamente
livre. Pobres homens, que vos rebaixais mais do que os brutos! Não
sabeis distinguir-vos deles? Reconhecei o homem pelo pensamento de Deus.
593. Podemos dizer que os animais só agem por instinto?
—Ainda nisso há um sistema. É bem verdade que o instinto domina na
maioria dos animais; mas não vês que há os que agem por uma vontade
determinada? E que têm inteligência, mas ela é limitada.
Comentário
de Kardec: Além do instinto, não se poderia negar a certos animais a
prática de atos combinados que denotam a vontade de agir num sentido
determinado e de acordo com as circunstâncias. Há neles, portanto, uma
espécie de inteligência mas cujo exercício é mais precisamente
concentrado sobre os meios de satisfazer às suas necessidades físicas e
proverá sua conservação. Não há entre eles nenhuma criação nenhum
melhoramento; qualquer que seja a arte que admiramos em seus trabalhos,
aquilo que faziam antigamente é o mesmo que fazem hoje, nem melhor nem
pior segundo formas e proposições constantes e invariáveis. Os filhotes
separados de sua espécie não deixam de construir o seu ninho de acordo
com o mesmo modelo sem terem sido ensinados. Se alguns são suscetíveis
de uma certa educação, esse desenvolvimento intelectual, sempre fechado
em estreitos limites, é devido à ação do homem sobre uma natureza
flexível, pois não fazem nenhum progresso por si mesmos, e esse
progresso é efêmero, puramente individual, porque o animal, abandonado a
si próprio, não tarda a voltar aos limites traçados pela Natureza.
594. Os animais têm linguagem?
— Se pensais numa linguagem formada de palavras e de sílabas, não; mas
num meio de se comunicarem entre si, então, sim. Eles se dizem muito
mais coisas do que supondes, mas a sua linguagem é limitada, como as
próprias idéias, às suas necessidades.
594 – a) Há animais que não possuem voz; esses não parecem destituídos de linguagem?
— Compreendem-se por outros meios. Vós, homens, não tendes mais do que a
palavra para vos comunicardes? E dos mudos, que dizeis? Os animais,
sendo dotados da vida de relação, têm meios de se prevenir e de exprimir
as sensações que experimentam. Pensas que os peixes não se entendem? O
homem não tem o privilégio da linguagem, mas a dos animais é instintiva e
limitada pelo círculo exclusivo das suas necessidades e das suas
idéias, enquanto a do homem é perfectível e se presta a todas as
concepções da sua inteligência.
Comentário de Kardec: Realmente, os
peixes que emigram em massa, bem como as andorinhas, que obedecem ao
guia, devem ter meios de se advertir de se entender e de se combinar.
Talvez o façam entre si, ou talvez a água seja um veículo que lhes
transmita certas vibrações. Seja o que for, é incontestável que eles
dispõem de meios para se entenderem, da mesma maneira que todos os
animais privados de voz e que realizam trabalhos em comum. Deve-se
admirar, diante disso, que os Espíritos possam comunicar-se entre eles
sem o recurso da palavra articulada? (Ver item 282.)
595. Os animais têm livre-arbítrio?
— Não são simples máquinas, como supondes (1)mas sua liberdade de ação é
limitada pelas suas necessidades, e não pode ser comparada à do homem.
Sendo muito inferiores a este, não têm os mesmos deveres. Sua liberdade é
restrita aos atos da vida material.
596. De onde vem a aptidão de
certos animais para imitar a linguagem do homem, e por que essa aptidão
se encontra mais entre as aves do que entre os símios, por exemplo, cuja
conformação tem mais analogia com a humana?
— Conformação
particular dos órgãos vocais, secundada pelo instinto da imitação. O
símio imita os gestos; certos pássaros imitam a voz.
597. Pois se os
animais têm uma inteligência que lhes dá uma certa liberdade de ação,
há neles um princípio independente da matéria?
— Sim, e que sobrevive ao corpo.
597 – a) Esse princípio é uma alma semelhante à do homem?
— É também uma alma, se o quiserdes: isso depende do sentido em que se
tome a palavra; mas é inferior à do homem. Há, entre a alma dos animais e
a do homem, tanta distância quanto entre a alma do homem e Deus.
598. A alma dos animais conserva após a morte sua individualidade e a consciência de si mesma?
— Sua individualidade, sim, mas não a consciência de si mesma. A vida inteligente permanece em estado latente.
599. A alma dos animais pode escolher a espécie em que prefira encarnar-se?
— Não; ela não tem o livre-arbítrio.
600. A alma do animal, sobrevivendo ao corpo, fica num estado errante como a do homem após a morte?
— Fica numa espécie de erraticidade, pois não está unida a um corpo.
Mas não é um Espírito errante. O Espírito errante é um ser que pensa e
age por sua livre vontade; o dos animais não tem a mesma faculdade. É a
consciência de si mesmo que constitui o atributo principal do Espírito. O
Espírito do animal é classificado, após a morte, pelos Espíritos
incumbidos disso e utilizado quase imediatamente; não dispõe de tempo
para se pôr em relação com outras criaturas.
601. Os animais seguem uma lei progressiva como os homens?
— Sim, e é por isso que nos mundos superiores onde os homens são mais
adiantados, os animais também o são, dispondo de meios de comunicação
mais desenvolvidos. São, porém, sempre inferiores e submetidos aos
homens, sendo, para estes, servidores inteligentes.
Nada há nisso de
extraordinário. Suponhamos os nossos animais de maior inteligência,
como o cão, o elefante, o cavalo, dotados de uma conformação apropriada
aos trabalhos manuais. O que não poderiam fazer sob a direção do homem?
602. Os animais progridem, como o homem, por sua própria vontade, ou pela força das coisas?
— Pela força das coisas; e é por isso que, para eles, não existe expiação.
603. Nos mundos superiores, os animais conhecem a Deus?
— Não. O homem é um deus para eles, como antigamente os Espíritos foram deuses para os homens.
604. Os animais, mesmo aperfeiçoados nos mundos superiores, sendo
sempre interiores aos homens, disso resultaria que Deus tivesse criado
seres intelectuais perpetuamente votados à inferioridade, o que parece
em desacordo com a unidade de vistas e de progresso que se assinalam em
todas as suas obras?
— Tudo se encadeia na Natureza por liames que
não podeis ainda perceber, e as coisas aparentemente mais disparatadas
têm pontos de contato que o homem jamais chegará a compreender no seu
estado atual. Pode entrevê-los por um esforço de sua inteligência, mas
somente quando essa inteligência tiver atingido todo o seu
desenvolvimento e se libertado dos prejuízos do orgulho e da ignorância
poderá ver claramente na obra de Deus. Até lá suas idéias limitadas lhe
faraó ver as coisas de um ponto de vista mesquinho. Sabei que Deus não
pode contradizer-se e que tudo, na Natureza, se harmoniza através de
leis gerais que jamais se afastam da sublime sabedoria do Criador.
604 – a) A inteligência é, assim, uma propriedade comum, um ponto de encontro entre a alma dos animais e a do homem?
— Sim, mas os animais não têm senão a inteligência da vida material; nos homens, a inteligência produz a vida moral.
605. Se considerarmos todos os pontos de contato existentes entre o
homem e os animais, não poderíamos pensar que o homem possui duas almas:
a alma animal e a alma espírita e que, se ele não tivesse esta última,
poderia viver só como os animais? Dizendo de outra maneira: o animal é
um ser semelhante ao homem, menos a alma espírita? Disso resultaria que
os bons e os maus instintos do homem seriam o efeito da predominância de
uma ou outra dessas duas almas?
— Não, o homem não tem duas almas,
mas o corpo tem os seus instintos, que resultam da sensação dos órgãos.
Não há no homem senão uma dupla natureza: a natureza animal e a
espiritual. Pelo seu corpo, ele participa da natureza dos animais e dos
seus instintos; pela sua alma, participa da natureza dos Espíritos.
605 – a) Assim, alem das suas próprias imperfeições, de que o Espírito
deve despojar-se, deve ele lutar contra a influência da matéria?
—
Sim, quanto mais inferior é ele, mais apertados são os laços entre o
Espírito e a matéria. Não o vedes? Não, o homem não tem. duas almas; a
alma é sempre única, um ser único. A alma do animal e a do homem são
distintas entre si, de tal maneira que a de um não pode animar o corpo
criado para o outro. Mas se o homem não possui uma alma animal, que por
suas paixões o coloque no nível dos animais, tem o seu corpo que o
rebaixa freqüentemente a esse nível, porque o seu corpo é um ser dotado
de vitalidade, que tem instintos, mas ininteligentes e limitados ao
interesse de sua conservação(1)
Comentário de Kardec: O Espírito,
encarnando-se no corpo do homem, transmite-lhe o principio intelectual e
moral que o torna superior aos animais. As duas naturezas existentes no
homem oferecem ás suas paixões duas fontes diversas: umas provêm dos
instintos da natureza, outras das impurezas do Espírito encarnado, que
simpatiza em maior ou menor proporção com a grosseria dos apetites
animais. O Espírito, ao se purificar, liberta-se pouco a pouco da
influência da matéria. Sob essa influência, ele se aproxima dos brutos;
liberto dessa influência, eleva-se ao seu verdadeiro destino.
606. De onde tiram os animais o princípio inteligente que constitui a espécie particular de alma de que são dotados?
— Do elemento inteligente universal.
606 – a) A inteligência do homem e a dos animais emanam, portanto, de um princípio único?
— Sem nenhuma dúvida; mas no homem ela passou por uma elaboração que a eleva sobre a dos brutos.
607. Ficou dito que a alma do homem, em sua origem, assemelha-se ao
estado de infância da vida corpórea, que a sua inteligência apenas
desponta e que ela ensaia para a vida. (Ver item 190.) Onde cumpre o
Espírito essa primeira fase?
— Numa série de existências que precedem o período que chamais de Humanidade.
607. A) Parece, assim, que a alma teria sido o princípio inteligente dos seres inferiores da criação?
— Não dissemos que tudo se encadeia na Natureza e tende à unidade?
É nesses seres, que estais longe de conhecer inteiramente, que o
princípio inteligente se elabora, se individualiza pouco a pouco e
ensaia para a vida, como dissemos. É, de certa maneira, um trabalho
preparatório, como o de germinação, em seguida ao qual o princípio
inteligente sofre uma transformação e se torna Espírito. É então que
começa para ele o período de humanidade, e com este a consciência do seu
futuro, a distinção do berne do mal e a responsabilidade dos seus atos.
Corno depois do período da infância vem o da adolescência, depois a
juventude, e por fim a idade madura. Nada há de resto, nessa origem, que
deva humilhar o homem. Os grandes gênios sentem-se humilhados por terem
sido fetos informes no ventre materno? Se alguma coisa deve humilhá-los
é a sua inferioridade perante Deus e sua impotência para sondar a
profundeza de seus desígnios e a sabedoria das leis que regulam a
harmonia do Universo. Reconhecei a grandeza de Deus nessa admirável
harmonia que faz a solidariedade de todas as coisas na Natureza. Crer
que Deus pudesse ter feito qualquer coisa sem objetivo e criar seres
inteligentes sem futuro seria blasfemar contra a sua bondade, que se
estende sobre todas as suas criaturas.
607 – b) Esse período de humanidade começa sobre a nossa Terra?
– A Terra não é o ponto de partida da primeira encarnação humana. O
período de humanidade começa, em geral, nos mundos ainda mais
inferiores. Essa, entretanto, não é uma regra absoluta e poderia
acontecer que um Espírito, desde o seu início humano, esteja apto a
viver na Terra. Esse caso não é freqüente e seria antes uma exceção.
608.0 Espírito do homem, após a morte, tem consciência das existências que precederam, para ele, o período de humanidade?
– Não, porque não é senão desse período que começa para ele a vida de
Espírito, e é mesmo difícil que se lembre de suas primeiras existências
como homem, exatamente como o homem não se lembra mais dos primeiros
tempos de sua infância, e ainda menos do tempo que passou no ventre
materno. Eis porque os Espíritos vos dizem que não sabem como começaram.
(Ver item 78.)
SÉRGIO PEREIRA/KAJAIDE
ORIENTADOR ESPIRITUAL